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domingo, 23 de março de 2014

DIA MUNDIAL DA ÁGUA


 
atualizado às 14h17

Água é mais valiosa que petróleo, diz especialista

No Dia Mundial da Água, gerente da National Conservancy acredita que a humanidade sabe como preservar o mineral

 Foto: Getty Images Foto: Getty Images

  • Ana Lis Soares
O Dia Mundial da Água é comemorado neste sábado, 22 de março, como uma tentativa da Organização das Nações Unidas (ONU) de conscientização sobre o uso e a conservação do líquido. Neste ano, o tema é Água e Energia e traz em todo o mundo debates sobre a produção energética de forma limpa e econômica.  Segundo a ONU, mais de 1 bilhão de pessoas não tem acesso à eletricidade e outras 768 milhões não possui acesso à água potável.

A urbanização é alvo de preocupações em se tratando dos recursos hídricos
Em todo o planeta a água é preocupação, já que há forte aumento na demanda nos últimos anos acompanhado de aumento proporcional no consumo per capita. Soma-se a isso a poluição e degradação de mananciais e a crescente urbanização e está desenhado um cenário pouco animador no que diz respeito à preservação dos recursos hídricos.

De toda a água presente no planeta, só 3% está disponível como água doce. Destes 3%, três quartos está congelada nas calotas polares e 10% estão confinados nos aquíferos; portanto, à disposição em estado líquido resta apenas 15%.


Califórnia, Estados Unidos: a terra seca e rachada é visível no que costumava ser o fundo de Folsom Lake março em 20, 2014, em El Dorado Hills, Califórnia. Agora em seu terceiro ano consecutivo de condições de seca, Califórnia está passando por sua mais seco ano no registro, que remonta 119 anos, e reservatórios em todo o estado têm baixos níveis de água. Folsom Lake, um reservatório localizado a nordeste de Sacramento, viu a sua capacidade de diminuir ao longo dos últimos 2 anos de seca com os níveis atuais em torno de 20% do normal Foto: Getty Images
Califórnia, Estados Unidos: a terra seca e rachada é visível no que costumava ser o fundo de Folsom Lake março em 20, 2014, em El Dorado Hills, Califórnia. Agora em seu terceiro ano consecutivo de condições de seca, Califórnia está passando por sua mais seco ano no registro, que remonta 119 anos, e reservatórios em todo o estado têm baixos níveis de água. Folsom Lake, um reservatório localizado a nordeste de Sacramento, viu a sua capacidade de diminuir ao longo dos últimos 2 anos de seca com os níveis atuais em torno de 20% do normal
Foto: Getty Images

E a tendência é de piora. Entre os anos 1900 e 2000, o consumo de água no planeta aumentou em dez vezes (de 500 km3/ano para aproximadamente 5.000 Km3/ano). E os usos múltiplos da água, como alimentação, energia, indústria, também aceleraram em todo planeta.

Para os próximos anos, dois fenômenos vão impactar o acesso à água: expectativa, até 2050, é de que haja 9 bilhões de pessoas no mundo, com 47% desta população vivendo em grandes cidades; além disso, e espera-se que grande parte dos países apresentem um aumento de renda per capita. 

O que me deixa otimista é que sabemos para onde ir, temos bons exemplos de países que cuidaram de mananciais e conseguiram ter acesso à água em quantidade e qualidade

A urbanização é alvo de preocupações em se tratando dos recursos hídricos. Ela aumenta as demandas para grandes volumes de água e também os custos do tratamento, além das necessidades de mais energia para distribuição de água e a pressão sobre os mananciais.

Apesar dos números nos levarem a um risco de colapso, o gerente de Fundos de Água da organização The Nature Conservancy (TNC), Fernando Veiga, é otimista em relação ao futuro dos recursos hídricos. Para ele, o grande desafio do século XXI é equilibrar a demanda e a conservação, como através de cuidados com as mananciais. Fernando é claro: “é um grande desafio, mas nós sabemos para onde temos de caminhar”.


 Foto: Getty Images Foto: Getty Images

Conversamos com o gerente de Fundos de Água da TNC, que é uma das maiores organizações do mundo de conservação ambiental, presente em mais de 35 desde 1951. O especialista Fernando Veiga já liderou a campanha da TNC “Plant a Blillion Trees”, para restauração da Mata Atlântica do Brasil, entre outros projetos – como o recente “Movimento Água para São Paulo”. Veiga possui um Ph.D. em Desenvolvimento Rural da Universidade Federal do Rio de Janeiro e um diploma de bacharelado em Agronomia da Universidade Estadual Paulista.

No Dia Mundial da Água, o que é mais importante, no seu ponto de vista, a se fazer pela água no mundo? 

O grande problema é atender o aumento da demanda com a oferta de água. Acredito que a grande questão relacionada à água neste momento é que você tem para os próximos anos dois fenômenos que vão impactar o acesso à água: temos uma expectativa para 2050 de 9 bilhões de habitantes no mundo, com um aumento de renda per capita da população (o que é bom socialmente, mas um desafio ambiental). Alguns estudos veem um aumento de consumo de 64 bilhões de metros cúbicos, o que é um fator de expressão muito forte, significando uma série de problemas de atendimento desta demanda.

Para se ter ideia, em 2030, 47% da população estará vivendo em grandes cidades. Na América Latina, já sofremos um grande processo de urbanização. Há uma expectativa de que teremos em breve 70% da população vivendo na área urbana. Aliás, a América Latina já é o continente mais urbanizado do planeta.  
Em Quito, no Equador, nosso exemplo mais próximo, eles possuem um ótimo modelo de iniciativa, de parceria local entre as empresas de água e os fundos de água

Quando a gente pensa em água, pensamos em coisas muito básicas. Mas a água tem uma relação muito grande com alimentos (agricultura consome 70% dos recursos) e a produção de energia, coisas que são fundamentais. Hoje, encontramos a degradação de quase todos os mananciais de abastecimentos principais no mundo. Isso significa a devastação da cobertura vegetal original, o uso mal aproveitado de pastagens e processos de poluição.

Qual o cenário em relação à demanda X população na América Latina?
A água não é distribuída igualmente, você vê pelo exemplo da Amazônia, que possui enorme recurso, mas baixa densidade populacional. Já em São Paulo, temos uma concentração de demanda e percebemos problemas sérios, como este sofrido atualmente na Cantareira. E isto não atinge somente a capital, mas toda a área próxima das cabeceiras dos rios fornecedores. Em Piracicaba, Campinas, temos valores hídricos iguais a de países semiáridos. Outro exemplo interessante neste sentido, é Lima, no Peru, 70% da população do país vivem onde estão apenas 1,8% da água.

Você é otimista em relação ao futuro?
Sim, porque estamos trabalhando no sentido da conscientização em todo o mundo. Há um engajamento. No setor privado, grande parte das empresas vem percebendo a importância deste tema, investindo na manutenção e proteção de recursos hídricos e suas mananciais. No setor público, vemos que vários países com agências de água ativas, cada vez mais preocupadas. É claro que o desafio é muito grande e nós vamos ter de trabalhar de forma conjunta. O que me deixa otimista é que sabemos para onde ir, temos bons exemplos de países que cuidaram de mananciais e conseguiram ter acesso à água em quantidade e qualidade.

A maioria dos principais mananciais do mundo estão comprometidos, de acordo com Fernando Veiga Foto: Getty Images
A maioria dos principais mananciais do mundo estão comprometidos, de acordo com Fernando Veiga
Foto: Getty Images

Quais exemplos são estes?
Temos alguns bons exemplos: a Costa Rica dá incentivos econômicos ao setor agropecuário para a conservação e cuidados com mananciais, da natureza. Eles conseguiram trabalhar de forma conjunta na restauração desta natureza e recuperar importantes fontes de água. Em Quito, no Equador, nosso exemplo mais próximo, eles possuem um ótimo modelo de iniciativa, de parceria local entre as empresas de água e os fundos de água, possibilitando a qualidade e a oferta de água, e é algo que queremos replicar no Brasil: reunir um grupo de atores usuários de água, recolhendo recursos públicos e privados com parcerias com a população local, os chamados “produtores locais”.
A passagem deste valor econômico da água é mais forte do século 20 para 21

Outro exemplo é a cidade de Nova York, nos EUA. Lá encontramos uma das águas de melhor qualidade no país. Eles retiram o mineral em lugares distantes, e investiram pesadamente na década de 1990, com associações de produtores rurais. A água vem direto dos canais, não passam por tratamento de agua. É interessante do ponto de vista ambiental, social, econômico.

A água é o novo petróleo? O que você acha desta frase?
Com certeza! Aliás, a água é muito mais que o petróleo. Precisamos de água para tudo. O petróleo foi uma fonte de energia, é necessário, mas a água é essencial. A percepção a partir dessa frase tem a ver, claro, com a escassez. Nos casos na América Latina, achávamos que a água seria um bem inesgotável, que poderia se utilizar sem pensar. Mas, ao contrário, é um bem escasso, você tem que dar valor, você tem que tratar bem, você tem que punir quando tratam mal, acho que a água terá um valor econômico cada vez mais forte.

Indonésia - 22 de março: mulheres indonésias procuram água com conchas na praia neste Dia Mundial da Água, 22 de março de 2014, em Surabaya, na Indonésia. ONU reconhece a necessidade global de água e conservação de energia Foto: Getty Images
Indonésia - 22 de março: mulheres indonésias procuram água com conchas na praia neste Dia Mundial da Água, 22 de março de 2014, em Surabaya, na Indonésia. ONU reconhece a necessidade global de água e conservação de energia
Foto: Getty Images

A passagem deste valor econômico da água é mais forte do século 20 para 21. Porém, olhando para nós, acho que o Brasil está numa situação muito melhor que boa parte dos países... Ainda temos tempo para acertar. É um desafio, mas temos bons instrumentos.


Dados da ONU para o Dia Mundial da Água 2014 Foto: Arte Terra
Dados da ONU para o Dia Mundial da Água 2014
Foto: Arte Terra

Fernando Veiga é gerente de Fundos de Água e já liderou a campanha da TNC Plant a Blillion Trees para restauração da Mata Atlântica do Brasil. Veiga tem grande envolvimento com o Movimento Água para São Paulo, de conservação dos mananciais que fazem parte das fontes de abastecimento da região metropolitana e é uma iniciativa financiada pelo Fundos de Água. É Ph.D. em Desenvolvimento Rural da Universidade Federal do Rio de Janeiro e um diploma de bacharelado em Agronomia da Universidade Estadual Paulista


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